Mas os tempos mudaram. A famosa “manifestação de interesse”, que permitia a regularização já em solo português, acabou. O novo ciclo migratório exige que a decisão de partir venha acompanhada de um plano: saber onde morar, o que fazer, como legalizar-se e o que Portugal espera de quem chega. O que antes se fazia com o coração agora exige também a cabeça. Não se trata de uma barreira, mas de uma mudança de trilho.
Quem investe tempo em entender a cultura portuguesa, suas regras e seus ritmos, descobre um país irável. Um lugar onde é possível andar a pé à noite, beber água da torneira, ter o à saúde pública e colocar os filhos numa escola de bairro. Um país onde o tempo a mais devagar, mas os negócios não precisam ser lentos. O mercado português, sobretudo nas áreas de tecnologia, turismo, energia e economia verde, está aberto à criatividade e à ousadia. Mas exige clareza, formalidade e paciência. O “jeitinho” lá, vira tropeço.
Por outro lado, é verdade que a máquina burocrática lusa ainda precisa de modernização. Muitos que fizeram tudo certo ainda penam para renovar documentos ou enfrentar longas filas nas agências. A culpa nem sempre é de quem chega. E essa é uma ferida que Portugal precisa tratar com urgência.
Mesmo assim, quem se prepara colhe. Portugal não quer menos brasileiros. Quer brasileiros mais informados, que conheçam Fernando Pessoa e Pixinguinha, que saibam distinguir um pastel de Belém de um pastel de feira, que tragam na mala sonhos, mas também estratégia. E aí, quando tudo encaixa, a vida aqui pode ser como na canção partilhada por Caetano e Amália: "Estranha forma de vida" — mas uma forma boa, que acolhe.
No fim, a migração que dá certo não é só a que respeita as regras, mas a que transforma saudade em convivência. Portugal pode ser a nova casa de muitos — e será tanto melhor quanto maior for o cuidado com a porta de entrada.